24 de dezembro de 2007

Altruísmo

Primeiro texto (quase) exclusivo do “de alguma redação”.

Durante a primeira semana de deste mês, me dediquei a uma pauta sobre pessoas que se doam aos outros, daquelas típicas de fim de ano e que todo mundo fez em 2007.

A matéria já começou com a generosidade dos colegas, que indicaram os mais diversos personagens. Tudo ainda superficial. Sete perfis selecionados, hora de se aprofundar nessas histórias, saber o que faziam, quando, onde, o que, e por qual motivo ajudavam os outros.

Entre os personagens selecionados para a pauta, dona Maria foi a que mais me chamou a atenção. É uma senhora de 69 anos, conversadora e que vive de aposentadoria e de ajudar os outros.

Por causa dela, acordei às 5h e saí de casa quando ainda nem tinha amanhecido aqui em SP. Algo pra lá de exótico para quem trabalha no período da tarde e da noite.

O resto da história está no texto abaixo, escrito sem limitação de espaço. É óbvio que, quando a página com o tamanho certo chegou, eu tive de cortar o texto praticamente pela metade.

Mas eu tinha gostado tanto dela e da sua história que eu resolvi destrinchar apenas uma cópia dele e publicar o original aqui.

A reportagem completa, com todos os personagens, foi publicada ontem, dia 23/12/07. Dona Maria aparecerá por aqui novamente amanhã, mas com menos linhas...


São pouco mais de 6h e uma pequena fila começa a se formar próxima à escadaria do metrô, na praça Sé (região central de São Paulo). A fila, organizada e discreta, começa com cerca de 30 pessoas.

São desempregados e moradores de rua que esperam ansiosamente pelo café da manhã trazido uma vez por semana pela dona-de-casa Maria Santana de Jesus, 69 anos.

Quando ela chega, por volta das 6h30, já são mais de 300 pessoas.

A idéia de distribuir café da manhã na praça da Sé surgiu oito anos atrás, depois de um encontro que Maria chama de mágico. Ela passava pela praça em uma manhã de inverno quando viu um homem jovem, bonito e vestindo apenas uma calça, debaixo de uma garoa fina.

“Vi que ele estava com frio e perguntei pela roupa dele. Ele disse: “Só tenho isso”. Eu paguei um café para ele e prometi voltar no dia seguinte com roupa e mais comida. No outro dia, nem sinal dele. Perguntei a todo mundo por ele, mas ninguém sabia de nada.”

Como Maria estava com sacolas de comida e de roupa, distribuiu tudo ali mesmo, entre os moradores de rua.

“Começou um alvoroço e eu disse: ‘Não precisam fazer isso porque, enquanto eu estiver viva, não vai faltar café e pão para vocês toda segunda-feira’.”

Desde então, Maria conta que não faltou nenhum dia sequer. “Eu peço a Deus que ele me ajude e dê saúde para eu fazer isso. O resto eu posso ir buscar. Se eu ficar de cama e imaginar essa fila me esperando, eu vou morrer.”

Os pãezinhos são preparados no domingo à tarde. Maria, que ganha de aposentadoria pouco mais de R$ 500, paga R$ 25 para comprar 200 pães e ganha outros cem de doação.

A manteiga, o café e o chocolate em pó também são pagos do próprio bolso. A mortadela e o leite vêm de doações.

“Minha vida mudou muito daquele dia para cá. Eu estava me separando na época e meu marido bebia. Tinha muita bagunça na minha vida. Depois desse encontro, tudo ficou na paz. Foi um anjo que apareceu para mim.”, afirma a dona-de-casa, que tem quatro filhos adotivos.

No começo, Maria distribuía sozinha apenas 50 pães e ia de ônibus toda manhã de segunda-feira do Jardim São Bernardo (zona sul de SP).

Com o tempo, a quantidade de comida aumentou e Maria precisou da boa vontade de amigos para ter um carro que a levasse até a Sé. “Hoje, a única coisa que falta é um carro para fazer esse serviço, porque um dia tem mas no outro pode não ter”, lamenta.